Eu, quando menor em tamanho e maior em existência, era um pouco excepcional. Muito mais do que sou hoje. Amava minha unica irmã, cheiro e sabor de terra, o céu azul de Brasília e um vestido liberty de flores coloridas. Em dez minutos de extremo esforço cognitivo consegui apontar esses cinco puro-amores. Minha vida era intensa e inconsequente! Era maravilhoso. O vento era mais fresco, o sol mais quente, o kinder-ovo mais barato e as mágoas nem existiam. Nesta minha fase maravilhosa, algo foi marcado. Até sublinhado e grifado. Nos meus treze anos incompletos eu ganhei um amigo. Um daqueles que a gente não dá nome pela falta de existência física comprovada. Mas o meu eu realmente nunca vi. Nunca dancei ou pedi pra minha mãe para ele sentar conosco na hora do jantar. Eu o imaginava longe. Como um destinatário de cartas. Não sei o porque mas eu não precisava da presença corpórea dele. Só o queria como um ouvido amigo. A quem eu pudesse enviar meus andados pela Terra. Escrevia para ele tudo. Absolutamente tudo. Minhas histórias, cartas, lamentações e festanças. Contei a ele sobre meus dias e noites, namoros e namorados, simpatias e repulsas e nunca obtive uma resposta. Nada! Senti falta delas algumas vezes. Vezes essas que a unica verdadeira e sincera ajuda poderia vir dele. Porque era a ele que minhas verdades eram declamadas, pintadas e escritas. Aos outros eu só enviava mentiras, fingimentos e adaptações-de-roteiros. Transformei meus dias, paixões e desesperos em sínteses, canções, contos e diários de bordo. Até minhas esquisitices mais escondida e bobas ele tinha ciência. Do meu gosto por bules de chás, minha repulsa por gatos e meu amor pela cor das fogueiras. Não sei qual foi o momento em que decidi que não valia mais a pena escrever cartas para ele. Não que antes tivesse valido. Mas antes era necessário. Necessidade minha de poder ter com alguém um segredo. Meus segredos. Mas me lembro da primeira vez em que me comuniquei com o meu melhor amigo-imaginário. Das minhas singelas e sinceras, três linhas de apresentação.
"Sou eu, aquela garota que você nunca viu, nunca verá e que nunca existiu. Sei que você nunca me conhecerá pois não tenho certeza da minha, e nem da sua, existência, e com finalidade de uma boa companhia nas horas de imaginação insana e realidade inventada, crio você!"
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