segunda-feira, 25 de julho de 2011

Alícia

Era uma mulher com nome de meretriz. As vezes nem mulher parecia. Aparentava mais ser uma adolescente com a puberdade gritando pelo seu corpo. Encantador! Parecia mais uma ninfa, seduzindo os homens com a sua graciosidade e falsa-inocência. Filha da natureza. Tinha um cabelo negro que quando ela ficava nua, o contraste com a sua pele alva era sensualmente chocante. Olhos brilhantes, sardas espalhas pelas bochechas  e uma boca fina desenhada por Vênus. Uma jovem entregue aos impulsos do amor. Temperamental, sentimentalista e um pouco esquizofrênica. Mas era tentadoramente bela. Me fazia tão bem. Trazia vida ao meus quarenta anos. Não tenho a minima noção do porque ela escolheu me amar. Não passava de um homem mal resolvido como todos os outros. Com problemas de infância, orgulhos e traumas. - Sempre escutei isso dela -. Mas nos amávamos. Dizia querer envelhecer comigo. Começamos a mobiliar uma casa e construir um ninho de respeito e amizade. Um gosto muito excêntrico decorou nossa vida, papel de parede branco com flores azuis, um sofá bege e um vaso que me pediu para sempre encher com flores que representassem o nosso estado de espírito. Jacintos da noite, rosas, margaridas, narcisos e muitas outras já passaram por aquele vaso. Vivemos juntos por anos... Viajando, pagando empréstimos, comprando cortinas e tapetes novos, chorando mágoas e beijando a vida. Começou me pedindo por mais amor, mais demonstração-de-amor e com o passar do tempo foi me exigindo que eu parasse de fumar, colocasse uma aliança no seu dedo e até que tivéssemos um filho. Foi me cobrando mudanças drásticas em aspectos que já tinham se encrustado em mim. É difícil de se desfazer de personalidade e temores quando se tem quase meia centena de anos vividos nas costas, nas mãos e na cabeça! Eu amava você muito, só não conseguia passar por cima de mim para isso. Era árduo, complicado e doloroso. Sei disso, porque tentei por várias vezes. E estou disposto a tentar por mais milhares de vezes. Mesmo que eu morra tentando. Mas ela veio me dizendo que já tinha perdido muito tempo nessas tentativas de mudança no meu caráter. Que estava com receio de perder a boa idade lutando uma guerra já perdida a anos! Preferiria ter sido mandado para o exílio, desterrado da minha pátria, isolado de minha família e amigos do que ter escutado isso. Como chegou a isso tudo, não tenho a minima noção. Apenas em um dia ensolarado como qualquer outro,  parou de querer tentar a vida comigo. Espero que pelo menos tenha sofrido para isso, que tenha pensado por meses antes de tomar esta decisão. Quase um rompimento de contrato. Uma traidora de sangue. Mas se depois de todo esse pesar ainda quis se arrancar de mim, desejo que tenha sido a decisão certa. Para nós! Que tenha sido porque você conseguiu chegar a conclusões que eu não consegui chegar. Pode ser porque o sufocar dos anos tenham me cegado perante algumas. Ainda não consegui começar a prática do seu esquecimento, acho até que seja improvável, por eu não ter mais tantos anos de vida pela frente. E esquecer quem amou é algo que leva muito tempo. Décadas por vezes! Mas eu tenho um estoque enorme de elixires de esquecimento e ilusão. Utilizarei dele por ora. Talvez ele me cegue um pouco mais. Seria bom não ver tanta tristeza no mundo...

1 comentários:

Anônimo disse...

ótimo!

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"Nos demais o coração tem moradia certa, fica aqui, bem no meio do peito. Mas comigo a anatomia ficou louca, sou todo coração!" V.M

 
"O essencial é invisível aos olhos!" Saint-Exúpery